Conceituo Tantra, como sendo
“filosofia e prática; e um conjunto de tratados e de conhecimento, que visa a
abordar o ser humano em suas múltiplas dimensões”. No caso específico de Shiva
Tantra, este conjunto se baseia essencialmente na adoração à Shiva Shakti,
pois, tem-se como Meta de seu(s) processo(s) a União Mística com Deus (Shiva;
ou Shakti no Shakti Tantra).
Aqui é importante introduzir
a compreensão do que exatamente significa União Mistica com Ele. Então, Shiva
explica:
“União Mística não é mera ilusão de acreditar-se que se alcançou a fusão da forma com o que está acima da usual humana compreensão. Por União Mística que se compreenda um estado de completa conclusão ou síntese do que se entende como sendo a contraparte que busca se unificar com a Contraparte que a unifica por qualificá-la como quem Consigo conseguiu se unir. Unir-se é Comigo para sempre estar, junto de meu pensar se deixar permanecer e ao que Eu sinto permitir-se também sentir. Sendo assim, para desta forma viver, alguém tem que, com profundidade, se deixar à Minha Pessoa conhecer. Sem realizar-me enquanto tal, não há como experimentar à verdadeira forma de União que Mística na eternidade se faz”.
Para tanto, em uma dentre
tantas outras estratégias tântricas, dá-se orientação ao despertar da
kundalini, a qual, a partir da base da coluna, irá ascender ao chakra da coroa,
causando libertação e iluminação espiritual. A kundalini é uma fagulha da
própria energia feminina (Shakti) presente na experiência de vida de cada alma
individual (jiva) e a libertação desta última está na realização da união dela
com sua Fonte (Shaktiman) ou Shiva, a Consciência Absoluta.
Tal união entre Shiva e
Shakti, em Shiva Tantra, é buscada por meio do uso de prática espiritual
(sadhana) e aplicação de instrumentos tais como mantras, yantras e rituais.
Mas, no caso da busca personalista por tal unidade com o Senhor, deve-se
compreender que não existe propriamente uma fusão da alma com Seu
Criador/Sustentador/Destruidor. O que existe é a realização dentro de si do que
é essência masculina e, portanto, da fagulha de Shiva, a qual lhe faz ser
existente.
Ademais, tal realização se
completa quando, ainda no íntimo da pessoa humana, à fagulha de Shakti se
realiza, sendo ela a porção de essência feminina que, na interação com a
masculina, concede vida e movimento para o ser individual.
(...). Trata-se de uma União
que não é fusão completa e eterna, porque, embora seja de fato um tipo de
fusão, ela não representa a perda da identidade individual da alma, enquanto
associada da Pessoa de Deus. Então, fundir-se com Deus, conforme o que aqui se
descreve é, e ao mesmo tempo não é, autopercepção não-dual e/ou dual para com
Ele.
Esta forma de Tantra pode ser
estudada e praticada em dedicação exclusiva ou em paralelo a outras práticas
religiosas e esotéricas, de modo a complementá-las e reforçá-las, bem como de
suprir deficiências e aumentar as oportunidades de avanço em vida espiritual.
Deve-se, porém, compreender que a União entre Shiva e Shakti é a união entre a
matéria e o espírito ou a forma e a consciência, o que só é possível de
realizar através da união entre a alma e sua Fonte.
Sendo assim, tal Mística
União não deve ser vista como um mero símbolo de intercurso sexual, como alguns
pensam que seja, embora de fato qualquer elemento da vida possa ser
compreendido como canal de acesso à Divindade. Acontece que o Tantra
não-dualista baseia-se na percepção impessoal do Brahman, que está em tudo. Portanto,
quem o pratica pode buscar por Deus através da observação e contato com
qualquer evento ou mecanismo da natureza e da vida.
Não há nada de errado em
entender que a vida seja assim, mas, quando partimos de uma percepção
dualista/não-dualista (Bhedabheda) e, mais particularmente, pessoal de Deus
(Religião Bhagavata), vemos o Tantra como um conjunto de oportunidades para que
o Todo seja tocado pela alma que busca por seu Foco de Origem, que é também a
sua Meta Última.
Segundo tal compreensão, o
Supremo Brahman é a refulgência de Bhagavan (Pessoa Absoluta), a qual ilumina o
mundo e esclarece a consciência, devendo ser compreendido e realizado, para que
haja sublimação do ato de ser e superação da ignorância (Avidya).
Artigo obtido do livro Shiva
Tantra para a Libertação Espiritual, de Shri Krishna Madhurya, Editora Sétimo
Raio – RJ, 2017.